sábado

OCARTAZ úmido

OCARTAZ velho foi apagado.

Um minuto de silêncio pelo luto.

...


Tudo acaba de mudar. Após meses pensando o que poderia ser feito, a direção decidiu que OCARTAZ poderia ser útil para alguma coisa. Não poderia ficar aqui sendo comido por traças e fungos. Sempre se pode dar uma função nova à coisa. Se o urinol de Duchamp pode ficar no museu, isso daqui pode virar alguma coisa.

Repintado. Refeito. Reformulado. Nunca mais será o mesmo. Nem o urinol, nem OCARTAZ.

Agora, como você pode perceber, o cheiro de tinta fresca e úmida acaba de invadir o seu nariz. E dá prazer. Dá vontade de pôr a mão, sentir a tinta grudando nos dedos apertados. Ver a marca que seus dedos deixarão na tinta.

Dá vontade, mas, por favor, não ponha a mão ainda. Não quero que fique borrado. Espere mais um pouco, até que seque.

Só mais um segundo. Pronto! Agora sim. Faça o que quiser: já secou. Aproveite para chegar mais perto, tocar e sentir o frescor inédito. Veja como a parte azul é fria.

Sentiu? Pois então: ótimo. Cuidado com a dose, mas, se quiser, fique viciado. Você não precisa ficar tímido nem esconder sua vontade de você mesmo. Não contarei a ninguém.

sexta-feira

Líquido

Que se diga o que se diz no dito. Dizer é matar. Exemplifico:

O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa
era a imagem de um vidro mole que fazia uma
volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse: Essa volta
que o rio faz por trás de sua casa se chama
enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro
que fazia uma volta atrás de casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.

Manoel de Barros

Mas o que sobra da cobra ou da enseada não morre. Até que não haja.